Por trás das narrativas que dominam as redes sociais, há um embate silencioso que desenha os rumos de Florianópolis. Na Capital, a expressão “pessoal do contra” tornou-se a expressão de quem busca impor medidas sem considerar o impacto coletivo. Mas será que essa turma, acusada de frear projetos e apontar problemas, não está, na verdade, fazendo exatamente o que deveria ser feito?
A cena se repete com frequência. Alguém levanta um alerta sobre cortes no orçamento ou os alagamentos que inundaram ruas e casas nos últimos meses, apontando para o caos na mobilidade urbana e a infraestrutura insuficiente. De outro lado, há quem retruque: “São os do contra, atrapalhando o progresso”. Mas basta olhar mais de perto para perceber que, às vezes, o progresso é apenas uma “desculpa elegante” para decisões que ignoram o futuro sustentável da cidade.
O Plano Diretor e a corrida contra o tempo
Florianópolis está prestes a enfrentar uma transformação estrutural com o novo Plano Diretor, aprovado sob críticas pesadas de órgãos ambientais e especialistas. Entre pontos considerados inconstitucionais e incompatíveis com a legislação ambiental, o plano promete grandes obras, aumento no fluxo de carros e uma expansão urbana que não parece estar acompanhada de melhorias na infraestrutura básica – como coleta de lixo, drenagem ou ampliação de vias públicas.
Enquanto isso, as chuvas de verão, previsíveis e implacáveis, alagam bairros inteiros. O que poderia ser mitigado com planejamento preventivo e medidas de adaptação é, ao contrário, intensificado por decisões que desconsideram o impacto ambiental. A cidade, que deveria aprender com os sinais da natureza, parece insistir em repetir erros antigos.
A educação na berlinda
Outro campo de batalha é a educação. Recentemente, a Prefeitura decidiu atribuir aos auxiliares de sala – profissionais sem formação técnica específica – as funções de professores de educação especial. Uma medida que, em teoria, “ajudaria a resolver” um problema financeiro, mas que na prática promete criar outros ainda maiores.
Professores, já sobrecarregados e esgotados, enfrentam níveis crescentes de burnout. A decisão de economizar às custas da qualidade educacional ameaça diretamente a inclusão e o atendimento adequado aos alunos com necessidades especiais. No fim, são as famílias, as escolas e, inevitavelmente, os próprios alunos que pagarão o preço dessa estratégia financeira que trata a educação como um mero recurso secundário para equilibrar as contas públicas.
A Democracia e os números na Câmara de Vereadores
Na Câmara Municipal, o jogo de forças está longe de ser equilibrado, e o “nós contra eles” predomina. Com uma ampla maioria de 18 votos contra 5, os projetos da Prefeitura têm sido aprovados com relativa facilidade. No mandato anterior, o placar era de 19 a 4 – números que refletem mais a eficácia das articulações políticas do que a representatividade da diversidade de opiniões da sociedade. Não há obstáculo para aprovar projetos encaminhados pela Prefeitura.
A democracia, ao menos na teoria, é um exercício de representação dos anseios populares. No entanto, quando decisões que afetam diretamente a vida das pessoas são tomadas com pouca ou nenhuma transparência, a sensação de impotência cresce. E aqueles que cumprem o papel de fiscalizar – como os órgãos ambientais e o Ministério Público – tornam-se alvos fáceis do rótulo de “turma do contra”.
A natureza não perdoa
Os alagamentos de Florianópolis não são obra do acaso. Eles são consequência de um modelo de governança que ignora os limites da legislação ambiental e prefere fechar os olhos para alertas técnicos. É mais fácil culpar a chuva do que reconhecer que o “jeito de governar” está, há tempos, ultrapassado.
E o preço disso não se mede apenas em prejuízos financeiros. É o preço de um futuro incerto, onde a sustentabilidade dá lugar ao improviso, e o coletivo cede espaço ao individualismo.
Quem é, afinal, a turma do contra?
É hora de mudar o olhar. Quem está realmente contra o progresso: os que alertam para os riscos, exigem ajustes técnicos e defendem o cumprimento da legislação, ou aqueles que passam por cima do bom senso e ignoram as consequências a longo prazo?
Florianópolis, como tantas outras cidades, enfrenta escolhas difíceis. O caixa da Prefeitura está sufocado, e as decisões de corte já afetam setores essenciais, como a educação. Mas será que economizar hoje, às custas do amanhã, é o caminho?
Na luta entre narrativas para redes sociais e a realidade, fica o convite à reflexão. Talvez a ‘turma do contra’ seja só um nome maldoso para quem tem coragem de lutar pelo que importa: justiça, verdade e um futuro melhor. E, nesse caso, talvez seja hora de ser um pouco mais do “contra” – para finalmente estar do lado certo.