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RELENDO A PANDEMIA

RELENDO A PANDEMIA

Escrevi a crônica “O silêncio dos inocentes” há dois anos, bem no início da pandemia do coronavírus. Ela foi a primeira da série “Crônicas em Quarentena” sobre as mudanças que  a população do planeta sofreu. Ainda não estamos totalmente livres da Covid-19, mas algumas coisas começam a voltar ao normal ou ao “novo normal”, como preferem alguns.

No meu mundinho, voltei a ouvir o alarido da criançada na quadra de esportes do condomínio. Que alegria, escutar os gritinhos e até os palavrões que entram pela janela, enquanto escrevo este texto!

Talvez até os vizinhos que se incomodavam com a algazarra dos pequenos estejam felizes com isso.

Não consigo imaginar o que se passa na cabecinha deles e quais serão os reflexos dessa “prisão” de dois anos, longe da escola, da convivência com os amigos, com o medo instalado dentro de casa. Só desejo que continuem assim, em liberdade para brincar e viver sua “ aventura de pão e chocolate”. ( 02/05/2022)

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O SILÊNCIO DOS INOCENTES

A cada dia de quarentena percebo que alguma coisa desapareceu do cotidiano. Uma que me faz falta é a algaravia das crianças na quadra de esportes do condomínio onde moro. Elas se juntavam ali para jogar bola, amarelinha, o que fosse. Assim passavam os dias, cada qual no seu turno oposto ao da escola.

Estava acostumada a escrever e a fazer as tarefas de casa com aquele som ambiente de gritos, risadas, assovios, palavrões e o choro de algum menorzinho que o irmão mais velho era obrigado a carregar junto. Muitas vezes na indefectível assembléia de condomínio tive que interferir quando moradores reclamavam do barulho que os impedia de fazer a siesta, por exemplo.

Mesmo não tendo crianças em casa, eu argumentava que aquela alegre balbúrdia era sinal de vida, de futuro, de algo crescendo à nossa vista. Os vizinhos me olhavam como se eu fosse uma lunática, resmungavam e desistiam de colocar horários restritos para as brincadeiras dos pequenos.

Agora há silêncio na quadra, no pátio, na escadaria dos prédios. As crianças estão trancafiadas em casa, entediadas e reclamando de não brincar com os coleguinhas na escola ou com os amiguinhos do condomínio. A Covid-19 transformou os adoráveis anjos em transmissores de um vírus que pode infectar seus avós de forma letal. Imagino a dificuldade de explicar para eles que não podem abraçar a vovó, o nono, a bába

Estava quase terminando esta crônica quando escuto uma mãe falando debaixo da minha janela: ” Miguel, já te disse para não encostar na porta do carro, quando digo para não encostar em nada é em nada mesmo!”. Miguel, de uns quatro aninhos, choraminga com a bronca da mãe. Não deve estar entendendo nada. Como explicar a pandemia para os pequenos? Inventando um “bicho papão” ou uma fábula como o pai judeu no campo de concentração em “A Vida é Bela”, o filme de Roberto Begnini que levou o Oscar em 1999?

Logo, o carro dá partida e volto à escrita. Penso nos vizinhos que agora podem dormir sem o incômodo da gritaria infantil, mas duvido que estejam conseguindo. Enquanto encerro este texto só ouço o barulho do ventilador. O resto é silêncio. ( 02/maio/2020).

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MICROCONTOS

O conto “ Dia das Mães”, de Jeane Imthon, foi o segundo colocado no Prêmio Literário Literatura Mínima, do Clube de Criação Literária e do Café do Escritor. Ele é um dos cem microcontos da antologia, disponível em versão e-book e livro físico no site da Amazon. A renda da venda vai para o Grupo Nove Moedas, de apoio a causas humanitárias.

Os colunistas são responsáveis por seu conteúdo e o texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal Making of.

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