Um ato que não terá efeito prático

O desembargador Pedro Manoel Abreu, relator do processo que analisa a decisão do Tribunal de Contas do Estado, que, em maio deste ano, suspendeu o pagamento da equiparação dos salários dos procuradores do Estado com os da Assembleia, afirmou, em despacho, que o ato de anulação da equivalência, feito pela governadora Daniela Reinher, não tira o objeto da ação que será analisada pelo Tribunal de Justiça.
Na prática, o ato de Daniela pretende produzir mais efeitos políticos do que jurídicos, visto que a situação, ainda de acordo com o magistrado, já era de interrupção da validade do pagamento.
A repercussão imediata é a maneira da governadora em exercício mostrar à sociedade que, se estivesse investida do cargo de maneira efetiva e não apenas na interinidade, como ocorreu no início deste ano, jamais tomaria a decisão que gerou um pedido de impeachment contra ela e o governador, ora afastado pelo mesmo fato, Carlos Moisés da Silva.
Não se apaga um ato administrativo que já teve repercussão histórica com borracha ou pelo apertar do delete de um computador, principalmente este que já produziu inúmeros efeitos e crises políticas, como a finalização do Tribunal Especial de Julgamento que ocorre daqui a dois dias.
Manifestação
O despacho do desembargador Pedro Manoel Abreu foi provocado pela Associação dos Procuradores do Estado (Aproesc), que patrocina a causa contra o TCE.
Enquanto se discute ser o ato de anulação administrativa de Daniela valido ou não, a Aproesc faz denúncias de que advogados que atuaram na formulação do pedido de impeachment, do qual a governadora em exercício escapou pelo voto de minerva do presidente Ricardo Roesler, estariam por trás da decisão da atual chefe do Executivo, caso grave que necessita de apuração severa.
A dúvida
Nos corredores cada vez mais vazios da Assembleia, em função das medidas de proteção contra o Coronavírus, circula abertamente o mais novo estratagema para preservar Daniela mais tempo na interinidade do governo.
A jogada seria um pedido de vista, a ser feito por um dos cinco deputados ou por mais de um deles, que embarrigaria a decisão, no mínimo por mais 10 dias, o que coincidiria com a análise de continuidade ou não do segundo processo de impeachment contra Moisés, aquele que considera crime de responsabilidade o pagamento antecipado de R$ 33 milhões, sem garantia de entrega, dos 200 respiradores.
O que se antevê
Garantido o pedido de vista, o parlamentar proponente pretende apenas evitar que um eventual resultado favorável ao retorno de Moisés ao cargo interfira na análise da continuidade do outro processo, o que caracterizaria um escárnio para com a sociedade catarinense, como bem rotula o advogado do governador afastado, Marcos Fey Probst.
Depois que a trama fracassou e o deputado Julio Garcia (PSD), presidente da Assembleia, não se tornou governador em exercício, a protelação de um epílogo do primeiro pedido de impeachment seria um brutal ato de desconsideração com o cidadão, que espera por um desfecho jurídico para o episódio que cheirava à má política.
Placebo
Em tempos de pandemia, onde o retorno das atividades presenciais nas redes de ensino pública e privada ganhou ênfase, Daniela busca brilhar em cima de um assunto com desfecho assegurado no TJ e na Assembleia, que nada dependem de seu ato.
É quase como se fosse um placebo, que sugere ser um medicamento, mas não passa de uma peça de avaliação inócua para mostrar como evoluem os efeitos da doença em relação aos pacientes que tomam o verdadeiro remédio.