Por Fernando Pereira*
A tentativa de assassinato de Donald Trump em um comício na Pensilvânia, nos Estados Unidos, foi registrada por diversos fotógrafos que estavam no palco antes do início dos disparos. Mas uma foto específica foi a mais divulgada, principalmente nas mídias digitais. A foto foi tirada pelo fotógrafo de guerra Evan Vucci, vencedor do Prêmio Pulitzer. Ele é conhecido pela sua cobertura dos protestos que se seguiram ao assassinato de George Floyd, em 2020. A imagem capturada por Vucci já pode ser considerada simbólica. É uma foto que talvez ganhe prêmios pelo seu conteúdo, enquadramento e uso preciso de cores e irá se tornar uma parte importante dos registros deste momento da história norte-americana.
Vucci está olhando para cima com sua câmera. Ele coloca Trump em posição elevada, como a figura central rodeada por agentes do Serviço Secreto, que protegem seu corpo. Os agentes formam uma composição triangular que coloca Trump como vértice, levemente à esquerda de uma bandeira americana tremulando no céu. Imediatamente à direita de Trump, um agente olha diretamente para a lente de Vucci, com os olhos ocultos pelos óculos escuros.Esse personagem nos chama para dentro da imagem. Ele olha na nossa direção, observando o fotógrafo. Por isso, ele parece olhar para nós – ele espelha a nossa visão da fotografia e leva o nosso olhar para o punho erguido de Trump.
Destaque para os fortes elementos coloridos na imagem, que criam a ilusão de se reunirem para formar a fotografia. Contra o fundo do céu azul claro, tudo o mais na imagem é vermelho, branco e azul-marinho. O sangue que escorre pelo rosto de Trump combina com as listras vermelhas da bandeira americana. Num primeiro momento perecemos não observar estes elementos, mas com certeza eles demonstram como certas convenções fotográficas colaboram com a própria forma de observação e composição de Vucci, alinhadas às normas do fotojornalismo.
Como forma fotográfica de observação, existem ressonâncias familiares entre a fotografia de Vucci e outras imagens simbólicas da história americana. O melhor exemplo é a fotografia de Joe Rosenthal, Raising of the Flag on Iwo Jima (“Hasteando a bandeira em Iwo Jima”, 1945), durante a Segunda Guerra, no Pacífico. Quatro fuzileiros se reúnem na imagem para erguer e fixar a bandeira americana. Seus corpos formam uma estrutura de pirâmide na parte inferior central do quadro. Existem fortes coincidências visuais entre as imagens de Rosenthal e a recente foto de Vucci. Elas também demonstram como as formas fotográficas de observação se estendem para além da composição.
As imagens conduzem para outra forma fotográfica de observação, que significa observar o mundo e os eventos que nele ocorrem como fotografias, ou construir a história como se ela própria fosse uma fotografia. Vale ressaltar que, embora Vucci não tenha capturado o momento exato do tiro, a foto é de uma acuidade midiática fantástica para Trump. Ela se torna parte importante dos registros desse momento histórico. Na pós-verdade atual, a fotografia desempenha papel crucial na busca pela verdade. Portanto, a foto de Evan Vucci é poderosa por sua composição impactante, simbolismo e narrativa, acuidade e valor histórico. E como vimos até aqui, ela demonstra a importância do fotojornalismo na cobertura de eventos marcantes.
*Fernando Pereira é professor dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)
