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Cuidado, você está sendo gravado

Cuidado, você está sendo gravado
Gene Hackman em A Conversação

Os mais jovens talvez não saibam quem foi Mário Juruna.  Antes de se eleger como o primeiro deputado federal indígena do Brasil, em 1983, pelo PDT-Partido Democrático Trabalhista, ele foi cacique da tribo xavante na aldeia de Namunjá, em Barra do Garças, Mato Grosso.

Mesmo tendo vivido até os 17 anos isolado de centros urbanos, Juruna percebeu logo que não dava para confiar nas promessas do homem branco. Sua marca registrada era carregar um gravador quando percorria os gabinetes da Funai-Fundação Nacional do Índio, reivindicando a demarcação de terras xavantes. Costumava gravar todas as conversas com políticos. Esse gesto, encarado como algo folclórico, era a garantia de que eles não desmentiriam o que haviam prometido.

Lembrei do cacique porque hoje seria bem mais fácil para ele ter as provas de quem disse o quê. Juruna já estava afastado da política e não pegou a popularização da internet e redes sociais, nem os aparelhos cada vez menores e sensíveis, quando morreu em decorrência de diabetes crônica, aos 58 anos, em 2002.

Agora vemos diariamente na mídia vídeos de homens espancando mulheres entre quatro paredes, de policiais torturando suspeitos em becos, de conversas “pouco republicanas” entre políticos no celular. Está tudo aí, o “Brasil tá vendo”, como diz o bordão do reality show aquele.

Nas últimas semanas têm proliferado vídeos antigos de políticos achincalhando o chamado “centrão” – partidos menores que ditam as cartas – os mesmos políticos que agora parecem amigos de infância do mesmo “centrão”. – Ah, colunista, a política é a arte da conversa e da conciliação.  É, pode ser, ou como dizia Ulisses Guimarães: na política até a raiva é combinada! Mas que é constrangedor ver imagens e áudios onde hora avacalha e hora elogia o mesmo alvo, lá isso é. Sinto vergonha alheia quando vejo.

A língua de três pontas

Uma coisa é certa: tudo vaza. Isso vai além da seara política, embora seja onde mais resida a arapongagem. Está no dia-a-dia de quem usa as redes sociais.

A ideia do big brother, criado por George Orwell em “1984”, nunca foi tão real. Passamos a ser “espionados” por câmeras de segurança, aparelhos celulares, botões de lapela etc… Por causa disso estamos falando menos ou cuidando mais com as palavras? Não. Ao contrário, mesmo sabendo que os canceladores – os justiceiros das redes sociais – estão à espreita de qualquer deslize estamos sem freio e temos opinião sobre tudo e todos. Não aderimos à sabedoria árabe de que “palavra é prata, silêncio é ouro”.

Lembrei também da língua maldosa de três pontas do Talmud: uma fere aquela de quem se fala; outra fere aquele a quem se fala; e a terceira fere aquele que fala.

p.s.: Hum, convém revisar bem esta crônica…

(Brígida De Poli)

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CINE & SÉRIES INDICA:

A crônica de hoje me fez lembrar de dois ótimos filmes sobre o tema espionagem, o alemão A vida dos outros e o americano A Conversação..

A VIDA DOS OUTROS – direção:  Florian Henckel von Donnersmarck – 2007 – Prime Vídeo

Esta é uma das produções alemãs mais premiadas das últimas décadas. Levou inclusive o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. A trama:Georg Dreyman é o maior dramaturgo da Alemanha Oriental, sendo por muitos considerado o modelo perfeito de cidadão para o país, já que não contesta o governo nem seu regime político. Apesar disto o ministro manda espioná-lo para descobrir se Dreyman tem algo a esconder. Ele passa esta tarefa para Anton Grubitz, que a princípio não vê nada de errado com Dreyman mas é alertado por um subordinado de que ele deveria ser vigiado. Grubitz passa a tarefa a Wiesler, que monta uma estrutura em que Dreyman e sua namorada, a atriz Christa-Maria Sieland, são vigiados 24 horas. Ele acaba fascinado pela “vida dos outros”.

 

A CONVERSAÇÃO – direção: Francis F. Coppola – 1974 – Telecine/Now

Gene Hackman, que infelizmente anda ausente das telas, interpreta um solitário especialista em vigilância, contratado para espionar um casal de amantes. Ele carrega uma culpa do passado e acaba tendo uma crise de consciência quando suspeita que a dupla investigada será assassinada.  Aos poucos, ele vai entrando em paranoia. A tecnologia mudou dos anos 70 pra cá, mas o filme de Coppola não ficou “ datado”. Continua bom como antes.

 

Irresistível – direção: Jon Stewart – 2020 – Telecine/Now

O resultado final desta comédia política poderia ser melhor porque a premissa é ótima: Gary, um talentoso estrategista democrata descobre o veterano Coronel Jack Hastings através de um O inspirado discurso num vídeo no YouTube, defendendo imigrantes. Disposto a ampliar a base democrata na conservadora região do Wyoming, Gary faz pessoalmente a campanha de Jack para a prefeitura. Ele é super bem tratado pelos moradores, as vultosas doações começam a chegar e tudo parece promissor, até chegar o dia da votação. A melhor coisa do filme é Steve Carrell no papel do conselheiro. Nenhum desses outros comediantes famosos como Adam Sandler, Will Ferrell ou Bem Stiller chegam aos pés de Carrell (que já demonstrou ser bom de drama também). O papel do coronel também está em boas mãos: Chris Cooper, vencedor do Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por Adaptação.

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SÉRIES

Succession – vem aí a 3ª temporada (finalmente!) – HBO

Os serviços de streaming andam tão pobres de novas séries que só resta ficar na torcida para a chegada de novas temporadas das que a gente já conhece e gosta! Finalmente, a HBO está anunciando a 3ª temporada de Succession. Enquando ela não chega, dá para ver ou rever as duas primeiras, disponíveis na HBO/Now.

A história centra no núcleo familiar Roy: um pai autoritário e crítico, três filhos e uma filha que disputam a sucessão do patriarca no império midiático. O elenco é ótimo, a começar por Brian Fox, interpretando Logan Roy, o pai implacável que faz a gente ficar com pena dos filhos que também não são exatamente bonzinhos e éticos. Como se não bastasse, o genro, a atual mulher e um sobrinho fazem parte do caldeirão de briga pelo poder.

O que promete a nova temporada: Succession vai começar com o chefão Logan Roy em uma posição perigosa, após a traição do seu filho Kendall no final do segundo ano. “Enquanto ele tenta equilibrar alianças familiares, políticas e financeiras, as tensões crescem e uma batalha corporativa amarga ameaça dar início a uma guerra civil na família Roy”, diz o texto de divulgação.

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THE END

*Fotos reprodução/divulgação

 

Os colunistas são responsáveis por seu conteúdo e o texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal Making of.

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