Um jornalista que conheço há muitos anos, cuja característica principal é a moderação, disse que sai muito pouco de casa desde o final da eleição. E, quando sai, nunca realiza o mesmo trajeto, com medo de estar sendo seguido ou encontrar alguém indesejado.
Ele recebeu ameaças nas redes sociais, por comentários sem conotação política, mas de interpretação, quando em algum momento deve ter dito algo que não satisfez algum grupo.
Meu amigo está pessimista com as relações com a imprensa de agora em diante, tendo em vista a amostragem das últimas semanas. Penso que ele até foi privilegiado no patrulhamento, por enquanto só ameaça à distância, pois repórteres que estavam nas ruas com seus cinegrafistas do SBT, Record e Band foram ameaçados em vários Estados. Aqui, a NSC registrou no ar que não estava cobrindo determinada manifestação por questões de segurança. Outras afiliadas da Globo, como a gaúcha RBS, restringem coberturas, procurando mostrar eventos do alto para não terem que encarar ameaças no chão.
É algo incompreensível, pois se não fossem os repórteres e a mídia em geral os movimentos populares não seriam divulgados. É fato que são convocados pela internet, prescindindo da grande mídia, mas é ela que multiplica a repercussão. Assim, pressionar o intermediário é um ato impensado, mas alimentado por quem nos últimos meses fez todos os tipos de ameaças a empresas e jornalistas.
Essas ameaças, por sua vez, geraram nos últimos meses uma espécie de reação lenta e gradual por parte da grande mídia, em especial a Globo, por se sentir ameaçada, lembrada à exaustão que é uma concessão e – dependendo do Congresso – poderia ser cassada.
A emissora dos Marinhos tratou enfatizar na linha editorial os percalços do governo, liberando seus comentaristas para virarem o fio da imparcialidade, e chamando o movimento das estradas e nos quarteis de ilegais.
Só por isso se entende a comemoração dos jornalistas da redação da TV Globo vibrando e se abraçando quando foi divulgada a vitória de Lula. A imparcialidade foi de vez para o brejo.
Na Jovem Pan News, o empresário e dono conhecido por Tutinha fez uma limpa nos quadros, no dia seguinte à eleição de Lula, tirando do ar manifestantes travestidos de jornalistas, que dominavam o programa com boa audiência “Os Pingos Nos Is”. O mercado aguarda o que será da emissora, mas o conjunto de demissões provou que o programa existia para aprovar o governo.
Tudo tem explicação, todos têm seu lado, muitos têm razão, outros estão errados – aqueles que pedem intervenção militar, por exemplo, que provavelmente não viveram a repressão durante a ditadura. O que é preciso nesta hora é deixar a poeira baixar, assimilar a derrota e ver a vitória com responsabilidade.
Não é hora de oportunistas em final de carreira, ocupando microfones e câmeras, travestidos de imparciais.
O conservadorismo teve a chance de administrar o País, e não nos deixou em boa situação. Agora será a vez de dar oportunidade ao grupo de partidos mais à esquerda para ver se voltamos aos nossos melhores dias. Uma coisa é certa: os jornalistas de verdade estarão na trincheira das redações examinando com lupa todo o processo de gestão do País. Petrolão nunca mais.